A população do Rio
acordou atônita nesta sexta (16/02) com a notícia de intervenção militar no
estado. É a primeira vez desde a promulgação da Constituição de 1988 que um
general assume o controle das forças de segurança pública de um estado no
Brasil. Trata-se, portanto, de medida gravíssima, menos extrema apenas que a
decretação do estado de sítio e do estado de defesa.
A
intervenção representa, na prática, um duro aprofundamento do golpe
civil-jurídico-midiático iniciado em 2016, que tem representado severas
consequências para os direitos de trabalhadores e trabalhadoras do nosso País,
principalmente para a população negra e pobre, afetada de modo mais agudo pela
aprovação da reforma trabalhista e pelo corte dos gastos públicos pelos
próximos 20 anos.
Para moradores e
moradoras de áreas onde a militarização do cotidiano já se faz presente de modo
mais forte, a intervenção do governo golpista trará agravamento da política de
Estado racista e genocida de extermínio dessa população, especialmente jovens e
negros. Não é preciso esperar o anúncio das primeiras medidas para saber que a
intervenção reproduzirá as mesmas práticas implantadas pelas forças militares
em períodos anteriores e posteriores aos megaeventos por meio das Unidades de
Polícia Pacificadora (UPPs) e as operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
Aplaudidas por
amplos setores da sociedade que aderem a discursos fascistas, as intervenções
nas favelas vieram sempre acompanhadas de medidas que suspenderam o Estado
Democrático de Direito nesses territórios. Em Acari, Maré, Alemão, entre
outros, foram recorrentemente denunciados abusos de autoridade, prisões e
detenções arbitrárias, torturas, ameaças, mandados inconstitucionais de busca e
apreensão coletivos e execuções sumárias autorizadas pelos autos de
resistência, mecanismo criado pela ditadura civil-militar iniciada em 1964.
É assustador que
as operações militares antes, durante e depois da Copa e das Olimpíadas tenham
sido apenas um “treino” do que vivemos desde o fim dos Jogos: a militarização
do cotidiano como legado olímpico. Lembre-se que foi o general Braga Netto o
coordenador-geral das forças de segurança durante as Olimpíadas. Naquele ano,
2016, o Rio viveu um salto de mortes causadas pela polícia: de 645 mortes em
2015 para 925 mortes em 2016, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP).
Sob a neblina do
discurso da segurança e da garantia da “ordem”, a intervenção manipula o
sentimento de uma população com medo ao delegar poderes do Executivo ao general
Walter Souza Braga Netto, comandante da intervenção que pode durar até o dia 31
de dezembro de 2018. É a confissão assinada da incapacidade do governador Luiz
Fernando Pezão (PMDB) de gerir o Estado. No momento em que o governo golpista
de Michel Temer, reprovado por 70% da população brasileira, não soma votos
suficientes para aprovar sua vampiresca contrarreforma da Previdência, a
intervenção se utiliza do tema da segurança pública também como plataforma
política para que os protagonistas do golpe tentem a perpetuação do poder nas
eleições previstas para este ano.
É preciso
lembrar que a lógica militar não serve à segurança de civis. Forças militares
são treinadas para matar, e não para garantir paz nas comunidades. Estão entre
seus deveres a segurança das fronteiras nacionais e não o policiamento de
bairros. No Rio, 25% dos assassinatos foram cometidos pela polícia em 2017.
Somaram-se 1.124
homicídios decorrentes de intervenção policial somente no ano passado. Essa
situação calamitosa, que precisa de um basta, se torna ainda mais temerária na
perspectiva de que teremos mais forças militares circulando pelas ruas e
atuando amparadas por um decreto que poderá garantir intervenções arbitrárias
em escolas, hospitais, atos públicos, etc, sob o argumento da garantia da
“ordem”.
Além disso,
teme-se o uso da lei 13.491, de 13 de outubro de 2017, que mudou o Código Penal
Militar ao transferir à Justiça Militar o julgamento de crimes dolosos contra
civis por militares em atuações especiais. Tornam-se extremamente frágeis,
assim, os direitos constitucionais de cidadãos civis que terão como forças de
segurança tropas a serem julgadas por tribunais militares.
Nascido do
processo de redemocratização do País, o Instituto Pacs não pode assistir ao
agravamento do golpe no Brasil sem se posicionar visceralmente contra toda
forma de cerceamento de direitos civis e sociais conquistados com tanta luta
por trabalhadores e trabalhadoras.
Ao longo da
história, a democracia na América Latina sofreu ataques constantes que
culminaram na implantação de golpes civis e/ou militares. Foi assim na
Venezuela em 2002. Foi assim no Haiti em 2004. Os golpes de Estado mais
recentes, de Honduras em 2009 e Paraguai em 2012, apresentam características
semelhantes ao que estamos acompanhando com preocupação no Brasil atual.
Denunciamos todas
as medidas de aprofundamento do golpe: retirada de direitos trabalhistas, corte
de gastos públicos, judicialização da política, entre outras.
Continuaremos nos insurgindo contra qualquer tentativa de se instaurar um
estado de exceção no Brasil, desestabilizando a democracia e colocando em xeque
os direitos individuais e coletivos conquistados por meio de muita luta.
Seguimos unidos/as em luta contra o golpe de 2016; contra a morte da
população jovem, negra e de favelas; contra a violência contra as mulheres,
pela desmilitarização da vida!
Fonte: Instituto Pacs
REPORTAGEM WILLAME POLICARPO.
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